Artigo

Seminarista Wesllem Salardanho Palácios

DA MISSÃO AO CAMINHO ESPIRITUAL

Por Seminarista Wesllem Salardanho Palácios

 

No mês de outubro, toda a nossa Igreja no Brasil volta-se para a missão. Estamos com as agendas reservadas para visitas às casas, hospitais, comunidades ou paróquias vizinhas, escolas, lar de idosos e demais lugares em que percebemos a necessidade de orações, tempo de escuta e conversa, ser presença de Deus e oferecer esperança... e isso é louvável. Mas será que depois do dia 31 de outubro eu precisarei esperar um ano para fazer tudo isso outra vez? Eu experimentei tantos sentimentos bons nas missões que minha comunidade proporcionou e agora como poderei continuar experimentando? Um despertar missionário pode até ter início no mês das missões, mas não pode ter seu fim com o fim dele.

 

Jamais podemos criticar os vários movimentos que surgem nas nossas comunidades em vista de ir ao encontro dos vários de nossos irmãos e irmãs que padecem e carecem de atenção, carinho, acolhimento e de esperança. Porém, somos chamados a ampliar nossa visão e nossa atuação neste mundo. Reduzir nossas atitudes em favor dos irmãos a um único mês é limitar e empobrecer a potência da missão a nós confiada no momento em que recebemos o Espírito Santo no batismo.

 

O papa Francisco, na exortação apostólica “EvangelliGaudium” (A alegria do Evangelho), diz que “cada um dos batizados, independentemente da própria função na Igreja e do grau de instrução de sua fé, é um sujeito ativo de evangelização, e não seria apropriado pensar em um esquema de evangelização realizado por agentes qualificados, enquanto o resto do povo fiel seria apenas receptor de suas ações” (nº120). Aqui não se pretende condenar os cursos e encontros de formação para a atuação missionária, que também têm seu valor e são vistos como ferramentas a serem utilizadas na missão a fim de nos preparar para tantas situações desafiadoras que são comuns na missão. O que se pretende é abrir os nossos olhos para assumirmos a missão.

 

Outro documento que aborda a questão é o Documento de Aparecida, o qual diz que “todo batizado recebe de Cristo, como os apóstolos, o mandato da missão: ‘Ide por todo o mundo e proclamai a Boa Nova a toda a criatura [...]’ (Mc 16,15). Pois ser discípulo missionário de Jesus Cristo e buscar a vida ‘nele’ supõe estar profundamente enraizado nele.” E estar enraizado quer dizer comprometer-se com o Reino de Deus que tem Jesus Cristo como anunciador, iniciador , o próprio Reino em pessoa. É nele que eu devo espelhar-me. É no agir dele que eu devo modelar o meu.

 

O Documento de Aparecida convoca-nos à sermos “missionários do Evangelho não só com a palavra, mas principalmente com a nossa própria vida, entregando-a no serviço, inclusive até o martírio.” Aqui pede mais que apenas discursos. É necessária uma práxis missionária. O verbo (aquilo que pensamos e rezamos) precisa fazer-se carne (atitudes práticas). Da mesma forma que Jesus contou com os discípulos para construir o Reino, continua contando cada um de nós.

 

Só que colocar nossas orações na prática não é tão simples, precisa de muita disponibilidade. Mas também não fomos enganados de que seria fácil, uma vez que o próprio Jesus disse: “No mundo tereis tribulações, mas tende coragem: eu venci o mundo” (Jo 16, 33), ou seja, o mesmo Jesus, que é o modelo, também traz a força para enfrentarmos os momentos difíceis e nos dá a certeza de que não estamos sozinhos, pois, após o envio dos seus discípulos, Ele diz: “eis que eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos” (Mt 28, 20).

 

É desse resgate ou tomada de consciência da nossa condição inata de missionários que o mundo está tanto “carecendo” (necessitando). Ouso dizer que é a solução para fazer acontecer o Reino de paz, justiça, amor, igualdade, fraternidade..., o sonho de Deus para o seu povo – sonho querido e desejado por Deus. Mas perceber as situações difíceis que enfrentamos em nosso tempo e nos incomodarmos com elas é uma dádiva de Deus, pois só é possívelter empatia pelos nossos irmãos e até sofrermos com eles se formos afetados por tal realidade. Precisamos ver, fazer contato com as necessidades para termos compaixão. Olhemos o exemplo de Jesus que teve compaixão da multidão, que estava como ovelha que não tem pastor a partir do momento em que ele avê(Mc 6, 30-44).

 

Feito o contato e sentido as necessidades que Jesus está passando na pele de tantos irmãos e irmãs, e sentido a compaixão, são necessários os próximos passos que são o acolhimento e o comprometimento. No evangelho da multiplicação dos pães, acima citado, Jesus não deixa o povo ir embora com fome. É necessário saciá-los de suas mais diversas carências.

 

Ao ajudar nossos irmãos, é ao próprio Jesus que servimos, inclusive cantamos essa verdade em nossos momentos de comunhão, reconhecendo Jesus no próximo: “Onde está o teu irmão, eu estou presente nele.Onde sofre o teu irmão, eu estou sofrendo nele.Onde morre o teu irmão, eu estou morrendo nele.Onde salvas teu irmão, tu me estás salvando nele.Onde acolhes teu irmão, tu me acolhes, também, nele.” E então podemos dizer: mas quando foi que servi a Jesus? Não me lembro. Eu apenas fiz a um irmão necessitado. E então ouviremos do próprio Jesus: “Em verdade eu vos digo: cada vez que o fizestes a um desses meus irmãos mais pequenos, a mim o fizestes (Mt 25- 40).”

 

Finalizo trazendo as palavras do papa Francisco na mensagem do papa ao dia mundial das missões 2017: “Queridos irmãos e irmãs, façamos missão inspirando-nos em Maria, Mãe da Evangelização. Movida pelo Espírito, Ela acolheu o Verbo da vida na profundidade da fé humilde. Que a Virgem nos ajude a dizer o nosso ‘sim’ à urgência de fazer ressoar a Boa Nova de Jesus no nosso tempo; nos obtenha um novo ardor de ressurreição para levar, a todos, o Evangelho da vida que vence a morte; interceda por nós, a fim de podermos ter uma santa ousadia de procurar novos caminhos para que chegue a todos o dom da salvação.”

 

Sigamos o exemplo dos santos e de Nossa Senhora e peçamos a graça de perceber os sinais dos tempos e nos comprometer na continuidade da construção do Reino de Deus no aqui e agora da nossa história.