Artigo

Pe. Fábio Eduardo de Lima Santos

A SIMPLICIDADE DA VOCAÇÃO

Por Pe. Fábio Eduardo de Lima Santos

 

Muito se fala da crise vocacional na Vida Religiosa, crise do matrimônio, falta de vocações sacerdotais etc. É verdade que isso existe. Porém, não nos fixaremos nessa crise. Mas o que ela nos diz e o que o oposto dela nos aponta.

 

Creio que o ponto de partida é perceber que estamos muito movidos pelas más notícias, pelos erros, pelas perversidades. Alimentamos inconscientemente a reflexão de grande parte da mídia mundial: “notícia ruim dá audiência”. Por isso, não seguiremos por essa direção. Isso não significa ignorar a realidade. Ter bons olhos é aprender a ver como todo cristão deveria ver. Ou seja, perceber sempre a possibilidade do positivo do outro e da vida.

 

Falar de vocação é falar de uma comunicação pessoal e ao mesmo tempo tão coletiva que não só transforma uma vida, mas que de fato transforma muitas vidas. Se rapidamente pensarmos e observarmos quantas pessoas realizadas, felizes e inteiras encontramos em nossos caminhos, perceberemos que não são poucas. Homens e mulheres que enfrentam muitas dores, angústias, quedas e tantos outros desafios. No entanto, encontraram o fio condutor que os impulsiona para frente. Entenderam que não são radicalismos “puritanos”, nem tampouco a banalização que os fazem completos em sua vocação. Perceberam que o equilíbrio em uma vida saudável, aberta ao outro, apaixonada por si, entregue e confiante em Deus possibilita a compreensão de sua vocação e a resposta permanente a esse chamado. É exatamente isso que a crise nos ensina: olharmos o que é bom para abandonar o que não vale a pena e buscar o que nos é indispensável.

 

Talvez muitos de nós nos frustramos na vida sacerdotal, matrimonial, religiosa, consagrada ou ainda sem opção porque só observamos a parte rasa ou equivocada desse chamado. Em alguns momentos nos vemos incapazes e imperfeitos demais, ou buscamos uma perfeição que não nos pertence. Esquecemos que qualquer vocação só se realiza quando diante das fragilidades podemos deixar o poder restaurador do Senhor nos modelar a cada dia. No livro de Jeremias Deus já nos sinaliza isso: assim como o oleiro, Ele também pode nos modelar. Contudo, com uma grande diferença: enquanto o oleiro pode desfazer da obra imperfeita, Deus não desfaz de sua obra trincada. Ele encontrará sempre uma nova forma para nos modelar até sermos belos como devermos ser.

 

O amargo do mundo contemporâneo, o egoísmo consumista, a religião/Deus como produto que nos satisfaz tem arrancado de muitos de nós a simplicidade da vocação. Somos chamados para um caminho que pode até ser tortuoso e incerto. No entanto, é repleto de tantas belezas, docilidades e encantos que somente um coração aberto pode perceber. Vocação que se sustenta com um sorriso, com um abraço, com um afeto, com um gesto de gentileza, com um silenciar para ouvir o querer de Deus. Vocação que se desloca do seu centro para que Deus seja o centro. Vocação que se vê incompleta e que não se contenta em não buscar essa completude que só o amor a Jesus e ao outro pode oferecer.

 

É necessário estourar as bolhas de nossas fantasias e perceber que em nossa estrada existem tantas belezas, flores e encantos que nos possibilitará não desistirmos em nossas horas escuras. Pois mesmo que os olhos por hora não contemplem tal beleza, a alma já repleta desse amor saberá atravessar tal vale tenebroso e perceber que a vocação se faz no simples ato de viver e de amar.

 

Assim são as vocações verdadeiras: vida que se derrama, coração que sempre pulsa, alegria que ninguém arranca, abraço que se alarga, alma aberta para o infinito, amor que transborda e que é eterno...